segunda-feira, maio 07, 2007

Timor

Tinha 14 anos quando acendi uma vela pelas vítimas do massacre de Díli, que a Indonésia insiste em chamar de incidente. Lembro-me bem dessa noite, onde estava, e de olhar para a vela com o pensamento nessas pessoas trucidadas vivas por selvagens. Ao som das rajadas no cemitério de Santa Cruz, o povo daquela ilha respondeu com uma oração. Avé Maria, assim mesmo, em português. Uma história que só soube porque um jornalista corajoso e com meios para isso teve coragem de enfrentar e mostrar o que há anos se passava impune debaixo dos olhos do Mundo.

Tinha 20 anos quando me emocionei ao ver a capa do Diário de Notícias em branco. O País uniu-se por Timor e o maior jornal de referência do País anulou-se - afinal os jornais servem para informar - e prescindiu da manchete em prol de uma causa. Quem não estava rendido, não conseguiu ficar indiferente. Lembro-me de tentar reprimir as lágrimas pela união das pessoas, de mãos dadas nas ruas da cidade. Por Ramos Horta, por Xanana Gusmão, pelos timorenses refugiados nas montanhas que tinham tido coragem de deixar os esconderijos de décadas para exercer o direito de voto.

Tenho 28 anos e voltei a emocionar-me nas últimas duas semanas ao ler "A Ilha das Trevas" de José Rodrigues dos Santos. Trata-se da primeira obra de ficção do jornalista da RTP, datada de 2002, ainda antes de serem publicados êxitos literários como o "Codex 632" ou "A Filha do Capitão". De ficção, este primeiro livro, tem muito pouco, de romance menos ainda. Trata-se da história recente de Timor em factos, exposta como se de um conto se tratasse. Escrito como uma notícia, este trabalho personifica em Paulino da Conceição- uma personagem inventada - a vertente humana dos massacres. Paulino atribui outro valor aos números. Para ler e reflectir. É que a história de Timor não termina quando fechamos o livro de José Rodrigues dos Santos.

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